Capítulo 3: Preparando para a primeira viajem.
Bom, não demorou muito para mim ir dormir depois daquilo. Eu no meu quarto pouco arrumado e decorado apenas com uma cama e um guarda roupas, e Ramona em seu quarto, ainda menor e mais opressor que o meu. No dela ao menos haviam dezenas de roupas sujas, sobras de comida e objetos que ninguém sabe como foram parar lá (como um patinete ou louça suja. Louça suja que não era nossa.) Pelo menos ela tinha algo para decorar o quarto.
No dia seguinte, eu acordei como em qualquer outro dia, sai no mesmo horário de sempre, passei pelos mesmos lugares e cheguei na mesma hora de sempre. Quando cheguei também não vi nada de inédito, Rosa estava linda como sempre, Alice e André estavam discutindo como sempre. Fui em direção a minha mesa, sentei-me atrás de Alice e do lado de André.
-Acha que ela tá mais loira hoje?
André comentou.
- Não. Mas o corpo dela tá mudando.
- Sabia!! Eu suspeitei mas achei que tava ficando louco.
- Não, não, os peitos dela tão definitivamente...
Rosa interrompeu com um olhar de desaprovação. Balançava a cabeça negativamente e fazia um som que não se parecia com nenhuma sílaba.
-tsktsktsktsk....
Eu não era como o André. As vezes ele fazia observações e "piadas" que até eu me constrangia, mas sejamos honestos, eu ainda tinha 16 anos.
-Para informação de vocês dois, o cabelo dela realmente descoloriu um pouco, ela deve ter retocado ou sei lá. Ela tá sim mais loira. Mas eu entendo que vocês estejam olhando para algo mais importante agora, podem ficar a vontade.
Alice disse a última frase em tom sarcástico e, André respondeu:
-Oh, obrigado. Pode deixar.
Quando parei para dar mais uma olhada, notei que ela realmente estava mais loira.
O dia parecia igual a qualquer dia. Eu acordei cansado, comi pouco, chequei minha irmã dormindo derretida na cama de tão jogada, e não fiz nada de muito especial até então. O dia também parecia ser diferente de qualquer outro dia. Alice não estava revisando o tema do dia passado e André não estava babando em nenhuma garota. Ele olhava fixamente e ficava boquiaberto, mas não salivava como o usual. Até Rosa parecia diferente. Eu não entendi o motivo, mas ela parecia mais distante, menos centrada. Eu podia notar isso porque normalmente, como ela se sentava na frente da sala, próxima a porta, ela olhava para ver se o professor se aproximava de 3 em 3 minutos. Hoje ela só ficou alí, e ainda tá sentando diferente. Normalmente ela cruza a perna direita e não a esquerda. Decidi ignorar minha intuição, afinal, eu sabia tão pouco sobre ela que poderia facilmente estar errado.
O professor parecia não chegar nunca e o tempo parecia não passar. Olhei no relógio várias vezes, mas sempre que olhava novamente tinham se passado poucos segundos, o que começou a me incomodar um pouco. De repente, ignorando todos esses anos em que eu tinha me preparado para ter a iniciativa perfeita, jogando fora todo esse tempo que eu... Joguei fora... Rosa se levanta da cadeira com o olhar radiante de sempre, trazendo um dos seus infames desenhos, ela se senta do meu lado.
- Você é o Arthur né?
Gaguejando e tremendo um pouco, eu lambia os lábios por medo de ela me achar estranho quando notasse minha boca seca. Ironicamente, ela provavelmente me achou estranho por ficar lambendo os lábios enquanto falava.
-Ahh... Sim.
Ela suspira e olha para os lados. Mesmo nervoso, pude notar que ela estava tateando o ambiente em busca de assuntos. Eu quase pulei da cadeira de felicidade só de ter notado a possibilidade de ela estar se esforçando para conversar comigo, mas me contive usando todos os músculos do meu corpo. Eu teria muitas oportunidades de pular depois (e provavelmente pularia até minhas pernas quebrarem e eu ter que aprender a pular com os braços ou sei lá) mas agora era minha única chance de realmente conversar com ela.
- B-bom...
Eu solto entre tossidas de vergonha, e ela volta seu olhar para mim de imediato, o que me deixa ainda mais nervoso
- P-posso... Posso ver seu... Seu desenho?
Eu me esforcei mais para dizer essas poucas palavras que em todos os meus anos de escola. Não demorou para que ela me desse o caderno e eu pudesse apreciar um desenho vivamente colorido, não dava para acreditar que ela tinha usado lápis de cor.
-P-pensei que você desenhasse leões...
A segunda frase saiu com mais facilidade, mas ainda assim era bem mais difícil do que deveria ser. Ela riu bastante, mesmo que meu intuito não fosse dizer nada engraçado, eu ri também. Como eu já disse, nunca fui bom em fingir ou disfarçar emoções, então minha risada saiu mais robótica que o normal.
- Você acha que um desenhista fica repetindo o mesmo desenho? Isso não faria sentido!
Ela disse entre risadas e eu respondi:
- Você faz isso!
Eu disse. Continuava tentando rir com ela, mas aquela risada me parecia cada vez mais familiar. Destoando da risada que costumava vir dela e se assimilando cada vez mais a de mais alguém...
- Você desenhou exatamente 342 leões em 4 cadernos diferentes esse ano.
Quando fechei a boca percebi que talvez não tivesse sido uma boa ideia anotar esse número. Eu juro que não era nenhum esquisitão, só estava procurando por assuntos para ir até ela.
Depois de rir muito, muito mais do que deveria, eu finalmente me lembrei de quem era aquela risada.
-Eu não tô acreditando que você fez isso.
Disse entre os dentes. Parei de forçar aquela risada estranha e fui direto para uma raiva genuína.
- Eu aproveitei bastante minha adolescência, pode-se dizer que eu fui uma garota "fácil"...
Rosa dizia, agora com a inconfundível voz rouca e falha da minha irmã idiota.
- Mas nem eu daria chance para um cara que conta quantos desenhos eu faço!!!
Ela continuou rindo ainda mais alto e eu acabei com aquela palhaçada num estalar seco de dedos.
Acordei na minha cama, enfurecido eu me levantei, ainda bem que não notei que era 4 da manhã. Eu teria ficado maluco.
- Pensei que o acordo fosse não invadir os sonhos um do outro!!
Eu disse furioso abrindo os braços e tentando não tropeçar naqueles obstáculos infinitos que se escondiam um no outro no chão escuro daquele quarto abafado. Ramona ria incessantemente.
- Lição número um: Por ser um Sandman, mesmo que alguém tentasse esconder os rastros, você notaria que tem algo de errado por pura intuição.
Minha irmã usou um tom de voz bem humorado, acho que ela estava acostumada com noites mal dormidas então ficava calma na madrugada. Vinha observando ela trabalhar havia muito tempo. Sabia que cobrir os rastros significava tornar o sonho o mais realista possível, afim de fazer o " adentrado" não saber distinguir o que é sonho e o que é realidade. Ramona gostava de chamar os clientes de "adentrados" as vezes. Dizia que quando eu fosse mais velho iria entender o motivo e que acharia graça também. Eu fiquei mais velho, entendi o motivo e ainda não vejo graça.
- Você me acordou cedo só pra me ensinar algo que eu já sei??
- Aprender algo novo é sempre bom, Arthur.
- MAS EU NÃO APRENDI NADA NOVO!!
Ramona sabia como me irritar. Bastava me sacanear e fingir que eu não tinha motivo para me irritar.
-Ah. Tem outro motivo também.
Ela disse, num tom de voz um pouco menos animado, mas com uma expressão sorridente no rosto. Eu estava muito nervoso, mas depois agradeci a mim mesmo por ter ouvido até o final.
-Bom, de acordo com meus cálculos... Uma certa garota leonina está em sono REM agora.
Entendi o que ela quis dizer. Sono REM é a fase do sono onde sonhamos, era perfeita para um Sandman inexperiente como eu invadir. Ela claramente estava falando sobre Rosa e eu fiquei vermelho.
Talvez a vermelhidão do meu rosto pudesse ser percebida mesmo no quarto escuro, já que Ramona continuou logo em seguida:
- O que foi? Você disse que ela normalmente vai dormir às 00:00 não é?
Eu realmente tinha dito. Não, eu não era estranho. Parem de pensar isso de mim!! Eu ouvi por coincidência!!!
- Me parece meio arriscado, não sei se eu quero tentar agora....
Um curto período de tempo é quebrado quando eu resolvo continuar depois de Ramona parecer claramente irritada comigo.
- Eu... E-eu só... Conheço ela bem pouco sabe....?
Ramona me deu um tapa na testa e foi pegar um casaco. Apontou para o meu quarto como que sugerisse que eu fizesse o mesmo. Acho que ela não pensou que o que eu disse merecesse alguma resposta.
Normalmente eu não deixava minha irmã me arrastar para as maluquices dela assim, mas o que aconteceu naquele sonho me assustou um pouco. Talvez eu devesse jogar o "Diário de anotações da futura noiva, volume 4" no lixo e.... Conhece-la melhor...
[Continua]
--Créditos--
Autor: Rudigu
Co-Autor: L.Maverick
Divulgado por: Mistérios Nerd
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